Uma das coisas que mais me surpreendeu quando cheguei em Canarana, foi saber que aqui é comemorado com muito entusiasmo o dia do gaúcho. Pensar sobre isso me levou a querer entender e explicar esse fato. Como boa psicóloga que sou, tratei de descobrir a história de Canarana e, relacionando com tudo o que tenho estudado na psicologia, consegui encontrar uma explicação no que chamamos de pertencimento.
Pertencer é uma necessidade vital a todos nós, sendo que a desconexão emocional, ou o não pertencimento, é o principal fator de adoecimento mental. Isso significa que precisamos de boas relações a que pertencer e de quem depender. O fato de que é preciso pertencer, significa que quando nos afastamos de quem amamos, seja nossa terra natal, nossa família de origem, nossa família de destino, precisamos sentir que ainda pertencemos. Precisamos nos sentir pertencentes, mesmo estando distantes.
Tendo como ponto de partida esse conceito, passei a considerar que o pertencimento foi um elemento fundamental aos gaúchos desbravadores. Algo que fez e faz com que as tradições gaúchas se mantenham tão vivas aqui e passem de geração em geração. Isso porque manter vivas as tradições de origem serviu e serve como elo conector com a terra natal, e serviu para acalentar a dor da saudade da família, dos amigos… de tudo o que era conhecido e ficou lá “embaixo”. Entendo um pouco disso porque também deixei o Rio Grande para morar aqui.
LEIA MAIS – Nome do pai:_______
E o que me deixa muito encantada por tudo isso, é ver o quanto o pertencimento é o elemento que nos faz repetir historias. É a repetição das tradições familiares que faz com que a gente continue se sentindo ligado à nossa família de origem, não importa o quão longe a gente vá, geograficamente.
Como podemos ver, algumas tradições gaúchas mudaram. Muitas ainda servem e são saudáveis, mas, felizmente, muitos jeitos de fazer e de se relacionar foram repensados, conforme a sociedade e a tecnologia foi mudando. Por isso, comemorar o dia do gaúcho é também tempo de comemorar mudanças, sabendo que, apesar de diferentes, ainda pertencemos.
Até porque, é necessário que as relações possam ser diferentes, em muitos contextos, como nas nossas escolhas amorosas, por exemplo. Não significa serem melhores ou piores, mas, que possam ser diferentes, porque reproduzimos tradições emocionais da nossa família de origem e, quando a gente repete o que funciona, também repete muitos padrões que não são saudáveis e causam sofrimento. Assim, corremos o risco de repetir historias de dores e sofrimento, como forma de nos mantermos pertences e conectados e leais às pessoas que nos deram a vida.
No entanto, as/os colonizadoras/es de Canarana, que deixaram as dores e dificuldades lá do Sul, para abrir mato e construir algo novo e próspero para futuras gerações, deixaram também uma historia que nos lembra de que, tomar distancia dos velhos padrões conhecidos em busca de algo novo, não significa abandonar ou romper com o passado, nem abandonar a nossa história, e não impede que a gente continue conectado aos valores e às pessoas que são importantes pra gente. Romper com padrões de sofrimento e buscar algo novo, nos negócios e na vida amorosa, é uma missão que precisa de coragem, mas é muito possível.
Minha admiração aos gaúchos e gaúchas, de todas as querências!
Por Bruna Sorensen – Psicóloga.